terça-feira, maio 17

Smile like you mean it


- “Tchau Mami!” – Gritou Rose para dentro da casa de banho.
Desceu as escadas a correr, entrou na cozinha e roubou uma maçã da fruteira que estava em cima da mesa. Bateu a porta de casa e pegou na bicicleta.
Não tinha paciência para colocar o capacete, sentia-se patética com aquilo na cabeça. No entanto, se não pusesse pelo menos as protecções de joelhos a avó ia reclamar. Assim, com o ar mais resignado do mundo, lá enfiou as joelheiras enquanto Biscuit, o seu pequeno rafeiro, saltitava e ladrava esperançado por um passeio com a dona.
 Soltou o cão, que agradecido pelo passeio inesperado deu uma lambidela no rosto de Rose e correu pelo pátio a toda a velocidade.
Biscuit fazia parte da ultima recordação que  Rose tinha do pai.
 Tinham-no encontrado quase morto, dentro de um saco plástico na borda do riacho que passa perto da casa da avó.
 Nesse dia, Rose e o pai tinham ido passear pelo prado.
 Lembrava-se bem desse dia - do sol quente, da brisa que soprava baixa, junto à erva e as flores que  dançavam ao seu ritmo.
O pai ensinava-a a fazer colares de flores, quando ouviram um gemido baixo vindo da margem do rio.
Libertaram o cachorrinho do saco plástico e levaram-no para casa.
Rose decidiu chamar-lhe Biscuit. Porque no dia em que o  trouxeram para casa, a mãe estava a fazer bolachas. Porque ele era pequenino e parecia aquelas bolachas redondinhas que a avó lhe costumava dar em pequena. E porque ela gostava da maneira como o nome soava - Biscuit.
Todos os dias de manha a menina visitava a avó. E todos os dias, sem excepção, Rose ia até ao prado, onde o pai a havia ensinado a fazer colares de flores. Montou na bicicleta e pedalou devagar ao longo do passeio. O vento trazia o cheiro morno de Primavera, o cheiro a terra, a relva e a flores. Quando chegou à entrada da casa da avó, pousou a sua adorada bicicleta no alpendre e entrou sem bater seguida por Biscuit.
Olhou para o relógio de cuco na parede da cozinha que marcava as dez da manha. Encontrou a avó sentada à mesa a descascar batatas e cenouras para o almoço.
 - Bom dia Pardalito! – Rose sorriu. Era assim que a avó a tratava, desde sempre, como o seu “Pardalito”. Beijou a avó na face morena, sulcada pelas rugas e sentou-se à sua frente.
- Bom dia avó, não se preocupe com o pequeno-almoço. Já comi e estou com pressa, só passei cá para lhe dar um beijinho!- Não adiantava falar . Era completamente impossível sair daquela casa sem comer, fosse quem fosse. A velha senhora levantou-se devagar e foi até ao antigo frigorífico buscar um pacote de leite para preparar o pequeno-almoço de Rose.
 - Bebe ao menos um copo de leite. Não te vai furar a barriga Rose – contestou a avó com um sorriso persuasivo.
Divertida, Rose foi ao armário e tirou um copo americano, com uma publicidade do pai natal da coca-cola. Verteu o leite frio para o copo, e bebeu com satisfação. Pousou-o vazio em cima da mesa e sorriu – Satisfeita? Bebi tudo… já cresci mais cinco centímetros, eu bem que senti as pernas a esticarem!
A avó riu. Uma gargalhada alegre a grave. Riu como só Rose a conseguia fazer rir. Era igual ao pai. Era exactamente igual ao seu filho. A pressa de crescer, a alegria de viver. Os lábios cor-de-rosa, bem desenhados, o nariz arrebitado. Parecia-lhe que até o bigode que o leite havia deixado por cima dos lábios de Rose, era exactamente igual ao do seu filho.
Com o rosto carregado de tristeza, limpou o bigode da menina, e disfarçou.
Um dia também o seu “Pardalito” ia ganhar asas para voar. E ela ia sorrir. Ia sorrir como se não quisesse chorar.

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